WILIAN MARQUES
- MARCIA MARQUES COSTA
- 27 de mar.
- 2 min de leitura
Infinito
A casa dos parentes, escondida no interior, é um relicário de memórias, um santuário de objetos e histórias empilhadas entre paredes decoradas pelo tempo, um lugar que dispensa a campainha ou as batidas, uma porta sempre aberta para o aconchego. O cheiro do café fresco e pão de massa sovada se espalha pela cozinha, misturado aos risos de alegria verdadeira. O chão de antigas tábuas range sob os pés como se conversasse com os visitantes, contrastando com as paredes recém-construídas. Cada canto guarda um silêncio repleto de vozes antigas. Os quadros de santos, uns católicos, outros ortodoxos, disputam espaço com fotografias amareladas de gente que já se foi, mas, por amor, insiste em ficar. Os olhos de Santa Rita se cruzam com os de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, e a fé de missas passadas parece impregnar até mesmo a poeira dos quadros.
A preciosa louça, sempre a mesma, repousa intocada no armário de vidro. Um conjunto de xícaras com motivos ingleses, talheres que brilham mais pelo zelo que pelo metal, pratos e pires.
São usados apenas para visitas e ocasiões especiais, embora ninguém saiba dizer com precisão o que torna uma visita digna da jarra de vidro decorado. A conversa ao redor da mesa, entre goles de café forte e pedaços de bolo de banana, se desenrola como um novelo desfiado sem pressa, sem urgência. Recordações se misturam ao cheiro do doce de abóbora.
Histórias do tempo da televisão preto e branco, quando crianças sonhadoras se empilhavam nas janelas dos vizinhos mais abastados para ver um filme pastelão, ou caminhavam longos passos para suspirar vendo uma novela, de uma época de galãs, princesas e grandes amores.
Entre risos e suspiros, alguém menciona a receita da avó para curar feridas: água morna, sal grosso e um pingo de cachaça. Milagroso, dizem. Assim como o emplastro de ervas que curava de tudo, de dor nas costas a coração partido. Se funcionava ou não, pouco importava.
A fé era parte do remédio. As avós e mães narram as peripécias dos filhos e netos com olhos brilhantes, misturando orgulho e saudade, tecendo o passado e o presente num bordado de lembranças eternas.
Lá fora, o vento morno balança as cortinas caprichosamente rendadas, como se quisesse espiar as histórias que se contam ali dentro. A tarde se espicha, quente e preguiçosa, como um gato ao sol.
O tempo, por fim, se revela: não é algo que se perd