Nomes como Salvador, Meneghel, Redivo, Cadorin, Cancellier e De Nez ficarão marcados na história de Urussanga como tendo seus artesãos na ferraria. Mas foram os da família Bettiol que se destacaram no início da colonização da cidade e deixaram sua marca no tempo em uma carranca de navio que atualmente está exposta no Museu de Brusque.
Essa história está relatada no livro da escritora Marcia Marques Costa- o Tanti Anni Dopo, do qual transcrevemos os trechos a seguir.
“Malho despertador
Com o dia curto para tanto serviço, os Bettiol iniciavam suas atividades na ferraria às 4h, no mais tardar 4h30min da madrugada. Mas o som do martelo na bigorna ecoava na pequena vila e não foram poucos os que começaram a reclamar com este indesejado despertador. Alguns chefes de família se reuniram e resolveram pedir, ao prefeito Pedro Damiani, que estabelecesse um horário para os Bettiol, evitando que o trabalho deles acordasse os demais.
O prefeito escutou com atenção todas as reclamações, pensou no caso por alguns momentos e depois disse aos seus munícipes: “ao invés de reclamarem, façam igual aos Bettiol. Levantem cedo e trabalhem, que Urussanga precisa de trabalho e progresso!”
E o som do martelo no malho continuou ecoando por muito tempo na ferraria, produzindo os apetrechos necessários para que a agricultura da época se desenvolvesse.
O navio grego que virou pá e foice
Adquirir material para a confecção das peças na ferraria não era tarefa fácil. Era necessário ir buscar longe e trazer no lombo de cavalos ou em carroças por estradas precárias. E o ferro podia vir de locais que nem se imagina hoje, como o de um navio encalhado.
Segundo Armando, neto de Ferdinando Bettiol, seu avô ficou sabendo que um navio grego havia encalhado na praia que hoje se chama Esplanada.
Ele foi à Capitania dos Portos em Laguna e comprou o navio para retirar o ferro que seria transformado em enxadas, foices e machados aqui em Urussanga.
Se hoje os veranistas reclamam dos buracos e do pó na estrada que leva àquele balneário, é de se imaginar as dificuldades que o imigrante italiano teve, por volta de 1900, para trazer 75 toneladas de ferro de Esplanada sem a ajuda de guindastes e caminhões.
Junto com o ferro, Ferdinando trouxe ainda a imagem de uma mulher que ficava na proa do navio e colocou-a na ferraria.
Alguns acreditavam que era a imagem de Nossa Senhora, mas Ferdinando acreditava ser a imagem de alguma deusa da mitologia grega. Esta imagem foi doada pela família ao museu Arquidiocesano de Azambuja, em Brusque.”
Em 2010 o jornal Panorama, com os repórteres Giovanni Marques Costa e Lani Burato, esteve no museu para confirmar a informação.
Escritora Marcia em sua visita ao Museu tentando imitar a carranca grega
A imagem estava lá. Com mais de dois metros de altura, a carranca de proa estava sobre uma mesa e bem conservada. Nas informações da ficha técnica do referido museu, constava que a peça foi doada no ano de 1959 pela família Bettiol ao Padre Raulino Reitz.
Padre Raulino foi o fundador deste museu e levou a carranca de Jeep para Azambuja, tendo passado trabalho no trajeto, pois o peso da imagem e as estradas precárias ocasionaram o estouro de dois pneus. Também está registrado na ficha, que a carranca foi retirada, em 1892, de um veleiro grego com 30 metros de comprimento e 10 metros de largura, e que o imigrante Ferdinando retirou 75 toneladas de ferro para trazer a Urussanga. Do litoral a Urussanga, foi utilizada a linha férrea até Pedras Grandes e, deste local até a ferraria, o transporte era feito em carros-de-bois. No ano de 2011, os diretores de Panorama também visitaram o Museu de Brusque e puderam ver a carranca já revitalizada exposta em um dos bem cuidados espaços daquele equipamento estadual de preservação da história catarinense. Além disso, encontraram várias peças sacras feitas pelo artesão urussanguense Beppi Frasseto.