Juiz de Direito Roque Lopedote, da 2ª Vara da Comarca de Urussanga, em decisão proferida na tarde desta quinta-feira 24/02, deferiu pedido de liminar do vereador Odivaldo Bonetti (Bonettinho) e determinou a suspensão da Comissão de Investigação e Processante que foi aprovada recentemente no legislativo urussanguense para analisar se houve quebra de decoro parlamentar dos vereadores Odivaldo Bonetti, Rosemar Sebastião e Fabiano De Bonna.
Vale ressaltar que o vereador Fabiano De Bonna já havia entregue sua defesa para a Comissão Processante esta semana, e Bonettinho entrou com um Mandado de Segurança na Justiça, o qual acabou resultando nessa suspensão até que seja julgado o mérito e sendo estendido aos outros dois que também estavam sendo julgados pela mesma Comissão na Câmara.
O documento assinado pelo Juiz de Direito Roque Lopedete diz o seguinte:
MANDADO DE SEGURANÇA
Nº 5000649-25.2022.8.24.0078/SC
IMPETRANTE: ODIVALDO BONETTI
IMPETRADO:DANIEL REJES PEREIRA MORAES
IMPETRADO:CAMARA MUNICIPAL DE URUSSANGA
IMPETRADO:ELSON ROBERTO RAMOS
DESPACHO/DECISÃO
Cuida-se de mandado de segurança proposto por ODIVALDO BONETTI contra ato supostamente abusivo e ilegal praticado pela MESA DIRETORA DA CÂMARA MUNICIPAL DE URUSSANGA, representado na pessoa do Presidente da Câmara, Sr. Elson Roberto Ramos; contra a COMISSÃO DE ÉTICA E DE DECORO PARLAMENTAR DA CÂMARA MUNICIPAL D EURUSSANGA, na pessoa de seu representante, Sr. Daniel Rejes Pereira Moraes e o MUNICÍPIO DE URUSSANGA, todos devidamente qualificados nos autos,consubstanciado em
"demonstrar que a denúncia movida contra o Impetrante não atende às exigências do art. 5, inciso I, do Decreto-Lei n. 201/67 e, por consequência, impede o exercício do contraditório e da ampla defesa".
Em síntese, informou que foi oferecida denúncia contra o ora impetrante e os vereadores Rozemar Sebastião e Fabiano Murialdo de Bona, por"Quebra de Decoro Parlamentar" de autoria do partido político Movimento Democrático Brasileiro de Urussanga, visando a cassação do impetrante e dos mencionados vereadores.
Aduz, que em 14/02/2022 foi intimado para oferecer defesa prévia,prazo este que se encerra no dai 24/02/2022, contudo defende haver várias ilegalidades que anulam o recebimento da denúncia e a formação da Comissão Processante.
Menciona as seguintes ilegalidades/irregularidades:
[a]inépcia da denúncia e ofensa ao cerceamento de defesa e contraditório;
[b]que as condutas incompatíveis com o decoro parlamentar, a qual lhe está sendo imputada na denúncia, não estão devidamente demonstradas, tão pouco há a data de sua ocorrência, não havendo relação com o período do impetrante no cargo de vereador;
[c]nulidade na votação para o recebimento de denúncia, ante o impedimento de umdos membros do legislativo Urussanguense por ofensa ao art. 5º., inc I, do DecretoLei nº. 201/67;
[d]interesse dos vereadores suplentes na conclusão do processo decassação.
Com base em tais argumentos, requereu a concessão de liminar, para ofim de ordenar a suspensão do trâmite do processo de representação até o julgamento do mandamus
e, ao final, a concessão da segurança, "para o fim de declarar a extinção do processo de representação por quebra de decoro parlamentar, em tramitação na Câmara Municipal de Urussanga, em face de todas as nulidades insanáveis que contaminam o procedimento"
É o breve relato.
DECIDO.
Como matéria de fundo tem-se que o ora impetrante, na condição de Vereador, foi submetido a processo destinado a sindicar o cometimento de quebra de decoro parlamentar, e por insurgir-se contra atos nele praticados, impetrou o referido writ of mandamus.
Sabe-se que, o direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança deverá estar comprovado desde logo, com a impetração, uma vez que nessa via processual não se admite dilação probatória para a sua comprovação.
A propósito, Hely Lopes Meireles ensina que: "Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais. Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança"1.
Além disso, sabe-se que:
"A medida liminar é provimento cautelar admitido pela própria leide mandado de segurança quando sejam relevantes os fundamentos daimpetração e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da ordem judicial, seconcedida a final (art. 7º, III). Para a concessão da liminar devem ocorrer os doisrequisitos legais, ou seja, a relevância dos motivos em que se assenta o pedido nainicial e a possibilidade da ocorrência de lesão irreparável ao direito doimpetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito - fumus boni juris epericulum in mora"2.
Logo, o pleito liminar, repita-se, configura medida extrema, quereclama a demonstração, ainda que perfunctória, dos requisitos constantes no art. 7º,III, da Lei n. 12.016/09, a saber: relevância dos motivos sobre os quais se assenta opedido do impetrante (fumus boni iuris) e a possibilidade de ocorrência de lesão irreparável ao seu direito se vier a ser reconhecido somente na decisão de mérito(periculum in mora).
Compulsando os autos, verifica-se que houve a apresentação de denúncia por "Quebra de Decoro Parlamentar" em desfavor de Rozemar Sebastião,Fabiano Murialdo de Bona e Odivaldo Bonetti, onde restou consignando o seguinte fato em desfavor do impetrante: "[...] c) Condutas incompatíveis com o decoro parlamentar imputadas ao Verador afastado ODIVALDO BONETTI, vulgo"Bonetinho" do PP, no bojo da "Operação Hera" da Polícia Civil: Já o Vereador afastado ODIVALDO BONETTI, vulgo "Bonetinho" do PP, em entrevista concedida à Rádio Marconi, "afirmou que foi afastado pela Polícia Civil por ter sido citado em uma ligação de que o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Samae)seria vendido e de que 10% do valor seria para o vereador". Trata-se de conduta grave, que deve ser apurada e, caso confirmada, aplicada a sanção de cassação de mandato, por ser incompatível com o decoro parlamentar [...]".
Da não demonstração da data na denúncia quanto aos fatos imputados ao impetrante
Na hipótese dos autos, embora o impetrante alegue que os fatos narrados da denúncia não possuem correlação com o período em que o mesmo era vereador, não há prova efetiva do alegado e, considerando que tal demanda dilação probatória, tal tese é incompatível com o Mandado de Segurança, que possui como finalidade principal proteger o direito líquido e certo, provado de forma prévia, que tenha sido violado por ato ilegal ou abusivo da autoridade co atora no exercícios das atribuições do Poder Público.
Frise-se, em que pese a inicial acusatória ter a obrigatoriedade de apresentar de forma detalhada os fatos e delimitar no tempo e espaço, sempre que possível, as condutas de quebra de decoro parlamentar que em tese estariam sendo imputadas ao vereador, o impetrante não comprovou que os fatos apresentados não possuem correlação com o período de atuação do mesmo no legislativo Urussanguense.
Desta forma, o impetrante não comprovou em sede liminar o fumusboni juris como requisito necessário para a concessão da medida pleiteada, por tal argumento.
Da nulidade na votação para o recebimento de denúncia, ante o impedimento de um dos membros do legislativo Urussanguense e interesse dos vereadores suplentes na conclusão do processo de cassação.
Ao argumento de que seria ilegal o recebimento da denúncia, o impetrante defende o impedimento do vereador Luan Francisco Varnier na votação de admissão da representação do processo parlamentar visando a cassação dos vereadores, pois aduz que o partido denunciante fez constar em Ata que o vereador mencionado não estava presente na reunião da executiva municipal do MDB,visando garantir a não ocorrência do impedimento do vereador Luan Varnier na votação da Câmara Municipal de Urussanga.
Também nesta tese, não procede o argumento do impetrante, uma vez que a tutela vindicada se confunde com o mérito da ação, isto porque,"se a medida liminar pretendida se confunde com o próprio mérito do recurso, como no caso dos autos, não é cabível a concessão diante do caráter satisfativo que o provimento contém, quando não se trata de proteção excepcional de interesse maior" (AgInt no TutPrv no AREsp 1680259/SP, Rel. Ministro FRANCISCOFALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 30/11/2020, DJe 02/12/2020).
Também é o caso da mencionada nulidade da denúncia, tendo em vista o interesse dos vereadores suplentes na conclusão do processo de cassação,pois tal tese se confunde com o mérito, não sendo cabível a concessão do pedido liminar pleiteado.
Da inépcia da denúncia e ofensa ao cerceamento de defesa e contraditório
Por outro lado, depreende-se, de modo perfunctório, que a argumentação do impetrante no que tange a inépcia da denúncia e ofensa ao contraditório e ampla defesa possui respaldo no entendimento dos Tribunais Superiores (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 0318922-79.2015.8.24.0023,da Capital, rel. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 25-04-2019), o que configura a probabilidade do direito autoral.
Destarte, a denúncia em desfavor do impetrante Odivaldo Bonetti, têm o seguinte teor:
[...] c) Condutas incompatíveis com o decoro parlamentar imputadas ao Verador afastado ODIVALDO BONETTI, vulgo "Bonetinho" do PP, no bojo da "Operação Hera" da Polícia Civil: Já o Vereador afastado ODIVALDO BONETTI, vulgo "Bonetinho" do PP, em entrevista concedida à Rádio Marconi, "afirmou que foi afastado pela Polícia Civil por ter sido citado em uma ligação de que o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Samae) seria vendido e de que 10% do valor seria para o vereador". Trata-se de conduta grave, que deve ser apurada e, caso confirmada, aplicada a sanção de cassação de mandato, por ser incompatível com o decoro parlamentar [...]".
Da leitura da inicial acusatória se dessume que o denunciante busca a cassação do impetrante e outros 02 (dois) vereadores por quebra do decoro parlamentar, a referência a fatos que estão sendo apurados em operação a cargo da Polícia Civil, denominada operação "Hera" e que supostamente vieram à público,após entrevista na rádio local pelo impetrante, quando manifestava sua defesa quanto à tais fatos, o que é deveras inadmissível, por maior que tenha sido a repercussão de tal investigação.
A acusação precisa ser objetiva, imputando de forma precisa a conduta que corresponda a pelo menos um dos incisos do art. 7º do Decreto Lei nº. 201/67,ou seja, não é possível a atribuição genérica do fato que configure a "quebra do decoro parlamentar", tão pouco, como já mencionado, a mera referência a fatos que estejam sendo investigados pela autoridade policial.
A peça acusatória deve, também, delimitar sempre que possível no tempo e espaço os fatos a qual estão sendo imputados ao denunciado (parlamentar),visando garantir ao mesmo o amplo acesso as informações à qual está sendo processado, garantindo-lhe o amplo contraditório e defesa.
O periculum in mora, por sua vez, é inerente aos fatos narrados na petição inicial, pois a continuidade do processo disciplinar, com a votação em plenário, tem o condão de gerar prejuízo de difícil reparação ao impetrante, diante de possibilidade de cassação do mandato parlamentar.
A demonstração de indícios de irregularidade formal quanto à falta de detalhamento dos fatos, bem como a delimitação do tempo e espaço que ocorreram é suficiente para o deferimento da liminar.
Salienta-se, por fim, que a presente decisão não se reveste de definitividade, na medida em que ela está limitada ao exame dos requisitos da liminar, sendo que a verificação aprofundada do caso será realizada na sentença,após as informações da autoridade coatora, cujas manifestações servirão para ensejara mais ampla análise da situação controvertida.
À vista o exposto,
DEFIRO
o pedido liminar, determinando a imediata suspensão do processo disciplinar insaturado para a apuração de quebra de decoro parlamentar pelo impetrante.
Os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença (art. 7º, §3º, da Lei 12.016/2009).
Notifiquem-se as autoridades coatoras - PRESIDENTE DA CÂMARAMUNICIPAL DE URUSSANGA, representado na pessoa do Presidente da Câmara,Sr. Elson Roberto Ramos; contra a COMISSÃO DE ÉTICA E DE DECOROPARLAMENTAR DA CÂMARA MUNICIPAL DE URUSSANGA, na pessoa de seu representante, Sr. Daniel Rejes Pereira Moraes -, para que prestem informações no prazo legal (art. 7º, I, da Lei nº 12.016/2009).
Considerando que o deferimento da liminar concedida, têm como fundamento a falta de detalhamento dos fatos imputados ao impetrante e, analisando a denúncia, tal situação também se encontra evidente em desfavor de Rozemar Sebastião e, por sua vez, deve também se estender à Fabiano Murialdo de Bona,uma vez que, apesar de em relação à este, a denúncia descreve de forma mais detalhada e objetiva os fatos para a qual está sendo imputado a quebra de decoro parlamentar, tais fatos possuem como base apenas a investigação criminal.
Doutro norte, não me parece prudente suspender parcialmente o processo investigativo de apuração de condutas incompatíveis de decoro parlamentar quando a denúncia foi feita de forma conjunta.
Assim, estendo o deferimento da decisão liminarmente aos denunciados Rozemar Sebastião e Fabiano Murialdo de Bona.
Dê-se ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada (art. 7º, II, da Lei nº 12.016/2009).
Após o prazo para manifestações dos impetrados e do órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, dê-se vista dos autos ao Ministério Público.
Intimem-se.
Cumpra-se com urgência.
Documento eletrônico assinado por
ROQUE LOPEDOTE, Juiz de Direito
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Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
2ª Vara da Comarca de Urussanga
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