Projeto começa pelo telhado e a busca por materiais a serem usados é difícil
Embora seja uma propriedade particular, o casarão edificado no ano de 1907 por Ângelo Nichele no ponto que separa a Praça Anita Garibaldi da Avenida Presidente Vargas, no centro da cidade, tornou-se um símbolo do arrojo do imigrante italiano que colonizou Urussanga.
Falar dele, é lembrar de um tempo em que as ruas não tinham pavimentação e sua manutenção era de responsabilidade dos proprietários dos lotes, sendo que os únicos veículos existentes eram à tração animal. Ostentar naquela época era ter um cavalo e uma bela sela para desfilar e um terno bonito com sapato reluzente para ir à missa.
Vê-lo, é tomar conhecimento da coragem de uma gente que abandonou um continente desenvolvido e enfrentou o medo do desconhecido para construir um novo mundo em mata fechada.
É lembrar da viúva Luísa Nichele que criou seus filhos sofrendo as dores do assassinato do marido Bernardo, e educou-os para serem vencedores.
É ouvir as notas musicais saídas do primeiro piano vindo para Urussanga a ecoar pelo tempo e ter exemplo de amor ao próximo ao descobrir que muitos viajantes famintos alí ganharam abrigo e comida.
Será difícil encontrar na cidade alguém que, mesmo não conhecendo as belas histórias escondidas entre as paredes do casarão, não admire sua imponência e que não lhe dedique carinho pela beleza do conjunto e perfeição dos detalhes.
Mas com 114 anos de existência, a resistência aos efeitos do tempo começa a enfraquecer este corpo familiar e cultural, onde as feridas tornam-se visíveis.
Tombada como patrimônio histórico arquitetônico do Município e do Estado, a edificação conta com o amor dos herdeiros, os quais há anos vem buscando junto ao poder público os recursos necessários para transformar o Casarão Nichele em um Empório da Benedetta, onde a tradição familiar ressurgiria a lembrar da B. Nichele & Cia dos primórdios da colonização da cidade.
Cansados de esperar e sentindo a grande dificuldade de contar com o poder público na questão financeira, os herdeiros resolveram bancar o restauro do patrimônio, contando com a ajuda do arquiteto Fernando Luigi Fontanella na elaboração do projeto do telhado.
Na linha de frente das decisões e representando os demais, estão os herdeiros Rogério Nichele Rocha e Augusto Nichele Ottoni de Almeida.
Esta semana, em entrevista à reportagem de Panorama SC, Rogério afirmou que estava feliz em iniciar os trabalhos de restauro no Casarão que lhe traz tantas lembranças da infância e juventude junto aos familiares, e que sentia-se mais feliz ainda e orgulhoso de saber que a população também tem um carinho especial pela edificação.
“Aquele Casarão abriga uma história triste, mas de muita luta, determinação e união. Meu bisavô Bernardo foi assassinado em um navio, deixando minha bisavó Luiza, chamada de Nonna Djidja, com os filhos Ângelo, Maria, Federico e Filomena. Quando chegaram a Urussanga, eles tinham ficado em lugar afastado do centro e foi a família Bettiol que os ajudou a conseguir este lote onde hoje tem o Casarão. Neste local eles construíram uma casa de madeira e começaram a trabalhar com vendas. Aos poucos, com o trabalho de todos, foram tendo sucesso. Construíram o Casarão que foi inaugurado no dia do casamento de meu avô Ângelo com Anita Forghest e nasceu a B. Nichele & Cia, cujo nome era em homenagem ao Bernardo que havia sido assassinado e ao filho do casal” explicou Rogério.
Já Augusto, que representa as filhas de Azi e Bernardo Nichele, explicou que restaurar uma edificação tombada é bastante difícil e se faz necessário seguir regras que, por vezes, dificultam os trabalhos.
“Eu tomei consciência do que é restaurar uma edificação tombada quando foi feita a obra na casa da minha avó, ao lado do Casarão Nichele. Foi preciso retomar fôlego para iniciar o projeto do Casarão e, embora tenhamos tudo aprovado pela Fundação Catarinense de Cultura, há dificuldade em conseguir material semelhante ao que foi usado em 1907 . Só para se ter noção, até empresa para fazer o telhado estamos com dificuldade de encontrar porque é preciso seguir rigidamente o projeto de restauro. Mas vamos conseguir, com certeza. Vamos honrar a memória dos imigrantes da nossa família que aqui se estabeleceram e, ao mesmo tempo, colaborar com a tradição local no Empório da Benedetta” afirmou Augusto.
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